O Clube



Sem Ressalvas Nem Concessões

No ano em que Spotlight – Segredos Revelados (EUA, 2015) saíra vitorioso da festa do Oscar com as estatuetas de melhor filme e roteiro original, O Clube (Chile, 2015) não conseguira sequer ser indicado na categoria melhor filme estrangeiro. Sandices desse naipe reforçam a cada edição o discurso daqueles que apontam a falta de credibilidade artística da premiação; neste passo, apesar de seu posicionamento tímido, para não dizer covarde, perante o assunto da pedofilia clerical, Spotlight já demonstrava desde muito antes da referida cerimônia o quão superestimado vinha sendo. Tal constatação negativa cresce ainda mais se além da análise isolada do produto for ele escrutinado sob o prisma da comparação com O Clube. Dentro deste contexto, a similitude temática das produções contrasta com as diferentes formas por elas utilizadas para denunciar e discorrer sobre os desvios de conduta de membros da Igreja católica, ensejando, assim, a inevitável conclusão de que Spotlight não faz sequer cócegas no espinhoso tema¹. Dito isso, cabe analisar o que torna, por seu turno, o trabalho de Pablo Larraín tão relevante e superlativo.

Voltando o olhar para o cotidiano de padres afastados da batina vivendo em isolamento numa casa de penitência, o diretor chileno repete uma façanha já antes demonstrada em No  (Chile/França/EUA, 2012), qual seja a notável capacidade de tornar envolvente assuntos a princípio áridos para o âmbito do cinema de ficção¹. Valendo-se de uma toada dessa vez mais sombria e perturbadora, Larraín não faz em O Clube qualquer tipo de concessão, o que lhe permite criar imagens chocantes além de diálogos estarrecedores que, ao contrário de Spotlight, jamais são interrompidos em nome do bem-estar do público. Neste sentido, os atos vis e escabrosos outrora cometidos pelos padres são relatados com riqueza de detalhes numa abordagem dura, honesta e, portanto, realista dos fatos. A baixeza moral de tais homens não é aqui camuflada, sendo escancarada sem que reste violado o devido direito de apresentação de defesa por parte dos respectivos personagens.
Frise-se que Larraín constrói sua obra a partir de uma opção narrativa arriscada porque repleta de armadilhas: no enredo os perseguidos são os indignos que, nessa posição, tem por algozes uma vítima do passado, além da própria Igreja. Tal condução da história, vale dizer, poderia facilmente provocar uma errônea inversão de valores, risco esse driblado através de um processo de humanização dos personagens cujo objetivo não é torná-los agradáveis e queridos aos olhos do espectador, mas sim fieis a suas personalidades e pecados.
Desta feita, revela-se um deleite testemunhar o domínio de Larraín sobre a linguagem audiovisual, isso porque o mesmo não demonstra qualquer dúvida sobre qual a porção exata de incômodo a causar, daí não extravasar a fronteira do que é estritamente necessário para tanto. Com efeito, o drama retratado é habilmente dirigido sem que excessos sejam cometidos em prol de um estilo ou de um ego. Para Larraín o que importa é ser coerente com as emoções envolvidas, aspecto esse em que conta com a valorosa colaboração de um elenco impecável no qual difícil é apontar quem expõe o rosto mais sofrido e marcado pela culpa.
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1.     No trata do plebiscito chileno que, na década de 1980, acarretou a saída de Augusto Pinochet do poder.

FICHA TÉCNICA


Título Original: El Club

Direção: Pablo Larraín

Roteiro: Daniel Villalobos, Guillermo Calderón, Pablo Larraín

Elenco: Alejandro Goic, Alejandro Sieveking, Alfredo Castro, Antonia Zegers, Catalina Pulido, Diego Muñoz, Erto Pantoja, Francisco Reyes, Gonzalo Valenzuela, Jaime Vadell, José Soza, Marcelo Alonso, Paola Lattus, Roberto Farías

Produção: Juan de Dios Larraín, Pablo Larraín

Fotografia: Carlos Cabezas

Montador: Sebastián Sepúlveda

Trilha Sonora: Carlos Cabezas

Estreia: 01/10/2015 (Brasil)

Duração: 98 min.

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